Em meio a importantes votações da agenda econômica no Congresso previstas para esta semana, como a reforma tributária, o governo federal enfrenta nesta quarta-feira (8) a mobilização de servidores públicos federais de diferentes categorias por reajuste salarial e melhorias nas condições de trabalho. A mobilização acontece após seis anos de relações tensas e defasagens nos reajustes salariais durante os governos Michel Temer e Jair Bolsonaro.
Com cálculos que apontam uma defasagem de até 53% para algumas categorias desde 2013, entidades de servidores de todo o país estão prevendo para esta quarta paralisações nos estados, além de atos na Esplanada dos Ministérios, em Brasília. O objetivo é pressionar parlamentares e a ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, responsável por conduzir as discussões salariais e de carreira das categorias.
As categorias buscam ainda mostrar força para a próxima rodada de negociações, na reunião da Mesa Nacional de Negociações Permanente, convocada pela pasta de Dweck para o dia 16 de novembro.
Desde o começo do ano, o governo tem mantido mesas de negociações específicas com encontros periódicos para negociar as demandas das categorias do funcionalismo público federal, além da mesa nacional permanente, com representantes de todas as categorias. Em nota, o Ministério da Gestão informou que foram criadas neste ano 10 mesas setoriais, para atender as situações específicas de cada área e reafirmou seu compromisso de diálogo com todas as categorias.
Segundo as lideranças sindicais, porém, até o momento o governo não teria apresentado uma resposta concreta às demandas que foram apresentadas de reposição inflacionária. Na mesa nacional realizada em julho, os servidores pediram ao governo que seja feita a reposição salarial com base na inflação acumulada dos últimos anos em pagamentos divididos em três parcelas anuais, com a primeira sendo paga em 2024.
Os líderes afirmam que a postura do governo tem causado indignação entre os servidores. Na mesa realizada em agosto, o governo afirmou que teria reservado no orçamento de 2024 o total de R$ 1,5 bilhão para atender as demandas do funcionalismo público federal. De acordo com os servidores, este valor representaria um reajuste de cerca de 1% para o funcionalismo.
Por meio de nota, o Ministério da Gestão afirmou que promoveu o primeiro acordo entre servidores e o governo desde 2016 que resultou em um “reajuste linear de 9% concedido a todos os servidores públicos federais e um aumento de 43,6%, no auxílio-alimentação: passando de R$ 458,00 para R$ 658,00”, diz a pasta em nota.
Além disso, a pasta também firmou acordos para estruturar carreiras específicas do funcionalismo. Em outubro, foi firmado um acordo com servidores da Funai para criar um plano especial de cargos da Funai e da carreira indigenista, que será composta por dois cargos: especialista em indigenismo e técnico em indigenismo. Em novembro, por sua vez, foi firmado um acordo para reestruturar as carreiras da Agência Nacional de Mineração, vinculada ao Ministério de Minas e Energia.
“O acordo estabelece a reestruturação das carreiras e também do Plano Especial de Cargos da Agência. Desse modo, a remuneração dos servidores integrantes das carreiras e do Plano Especial de Cargos (PEC) será equiparada à remuneração dos servidores das carreiras e dos PECs das demais agências reguladoras, e se dará em três parcelas: janeiro de 2024, janeiro de 2025 e em janeiro de 2026”, diz o Ministério da Gestão em nota.
‘Mesas de enrolação’
Apesar de reconhecerem uma melhoria significativa na relação com o governo federal em comparação com as gestões anteriores, os servidores têm cobrado uma resposta mais clara às suas demandas, que incluem ainda a revogação de medidas do governo Bolsonaro.
“Não havia diálogo nos últimos seis anos, nesse ponto de vista mudou completamente nossa relação com o governo. Hoje temos relação de alto nível, o governo nos chama para o diálogo, só que agora a base começa a cobrar que esse diálogo seja efetivo e se converta em melhorias de ambiente de trabalho, clima organizacional e melhorias remuneratórias”, explica o presidente do Fórum Nacional Permanente das Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), Rudinei Marques.
A entidade vai realizar uma live a partir das 14h desta quarta-feira (8) para que servidores de todo o país possam acompanhar o dia de mobilizações e se atualizar sobre as conversas com o governo. A entidade, porém, não divulga qual percentual de reajuste vai pleitear para as categorias. A entidade representa servidores que estão entre as carreiras mais bem-remuneradas do funcionalismo, como os servidores do Banco Central, da Receita Federal, da Advocacia-Geral da União e da Controladoria-Geral da União, dentre outros.
“Há uma frustração por um lado, e também uma indignação, esperamos que ele se transforme em sentimento de luta, uma vez que o serviço público deveria ser uma marca dessa nova gestão, a defesa do serviço público de qualidade”, afirma a presidenta em exercício do Sindicato Nacional dos Docentes de Ensino Superior, Raquel Dias. Para ela, a categoria tem sentido que as mesas de negociação do governo tem se transformado em “mesas de enrolação”.
“Estamos considerando que o governo está nos cozinhando em banho maria. Estamos na antessala ainda da negociação, porque a mesa se instalou em março e isso, a princípio abriu uma perspectiva boa. Ao ser instalada, criou expectativa de que as coisas poderiam encaminhar bem, mas depois acabou se tornando uma mesa de enrolação, nem na mesa salarial, nem na mesa que discute pautas não-salariais”, afirma a sindicalista.
A coordenadora-geral da Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-Administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas (Fasubra), Ivanilda Reis, reconhece que as categorias sabiam que o cenário seria desafiador com o Congresso atual que foi eleito e as composições com partidos e políticos não ligados à esquerda que o PT precisou fazer para chegar ao governo. “Nós sabíamos de toda dificuldade que seria esse governo de coligação, temos um parlamento com maioria reacionária, com proposta de ataque a servidores, inclusive defendendo a reforma administrativa. Nós sabíamos o que nós enfrentaríamos”, afirma.
Segundo ela, a ideia amanhã é fazer um ato simbólico na Esplanada dos Ministérios e também mobilizar servidores e professores nas universidades públicas em diferentes Estados. Para a mesa da semana que vem com o Ministério da Gestão, os movimentos já estão organizando caravanas e prometem uma mobilização maior em Brasília para fazer vigília durante a reunião das lideranças com o governo federal.
Cálculos das principais entidades sindicais e fóruns que representam os servidores apontam que, desde 2013, os servidores públicos federais vivenciaram duas situações diferentes. Uma parcela do funcionalismo público federal acumulou uma defasagem salarial de 53% em relação à inflação acumulada, enquanto outra, que teve mais reajustes, está com uma defasagem de 39,92%.
Brasil de Fato