A reforma Tributária deve ser a pauta econômica de maior preocupação do governo neste segundo semestre de 2019, depois dos cortes na Previdência. Como não é de se estranhar, existem inúmeras possibilidades para realizar mudança na forma como os impostos são cobrados no Brasil. As previsões sobre o que a equipe do ministro da Economia Paulo Guedes deve apresentar na próxima semana apontam para sobretaxa do consumo e conivência com patrimônio e grandes rendas.
Em debate no Congresso, entretanto, está a Proposta de Emenda Constitucional nº 45/2019, de autoria do deputado federal Baleia Rossi (MDB-SP). Em audiência pública realizada na Câmara dos Deputados na última terça-feira, 10, o ex-presidente do Banco Central e atual Secretário de Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo, Henrique Meirelles, apresentou a sugestão da PEC em questão, que propõe a substituição de cinco tributos sobre o consumo (IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS) por um único, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Além de instituir o IBS, a proposta contempla a criação do Imposto Seletivo (IS), que incidiria sobre cigarros, bebidas alcoólicas, armas, munições e outros produtos.
A PEC 45 foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e agora segue em debate na Comissão Especial, presidida pelo deputado Hildo Rocha (MDB-MA). A relatoria ficou a cargo do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB). No Senado, a PEC 110/2019, que também versa sobre alterações no sistema tributário brasileiro, está em discussão da CCJ da Casa. Esta proposta tem o objetivo de unificar nove tributos federais, estaduais e municipais em um único Imposto de Valor Agregado (IVA).
Para a Condsef/Fenadsef, de nada adianta a intenção de aumentar a arrecadação tributária se nenhum centavo a mais será revertido em benefícios à população, tendo-se em vista que os investimentos públicos foram congelados por vinte anos, de acordo com a Emenda Constitucional 95, assinada pelo ex-presidente Michel Temer. Uma sociedade igualitária e justa passa necessariamente pela revogação da ordem.
Além disso, unificar impostos ou criar novas taxas sobre o consumo – como tenta Paulo Guedes ao insistir no retorno da antiga CPMF – não resolve o problema fiscal do Brasil, conforme análise de especialistas.
Arrecadação
Da arrecadação tributária nacional, 50% constituem-se em impostos sobre consumo, enquanto impostos sobre patrimônio e renda somam quase metade do valor sobre consumo, segundo dados apresentados por Henrique Meirelles. Essa opção de política econômica, segundo o economista Juliano Musse do Dieese, vai na contramão das políticas tributárias implementadas nos países desenvolvidos.
Musse explica que, especialmente depois da Segunda Guerra Mundial, a construção do Estado de bem-estar social propiciou a redistribuição da renda gerada por meio orçamentário, com tributação sobre os mais ricos e transferências dos recursos dos fundos públicos para os mais pobres, financiando a transferência de renda para a população de menor renda e, assim, combatendo a pobreza, o desemprego e a desigualdade social.
“Por aqui, nosso sistema tributário não corroborou, nem corrobora, com os menos favorecidos, ao contrário, tem sido um instrumento a favor da concentração de renda, agravando o ônus fiscal dos mais pobres e aliviando o dos mais ricos”, analisa.
Para o economista Eduardo Fagnani, em seu recém-lançado livro “Previdência: o debate desonesto”, é necessário que os impostos deixem de incidir sobre a base salarial e passe a atingir a renda, o lucro e o patrimônio. “Estudos da Anfip e Fenafisco mostram que não é verdade que a nossa carga tributária seja elevada na comparação internacional, mas é fato que temos a maior carga que incide sobre consumo, que captura parcela maior da renda dos pobres e parcela menor da renda dos ricos”, explica Fagnani.
Destinação
De nada vale a intenção de aumentar a arrecadação se o destino dos recursos não são trabalhados com responsabilidade, justiça e preocupação social. Juliano Musse explica que, no Brasil, a cada R$ 3 arrecadados pela tributação, somente R$ 1 termina alocado livremente pelos governantes.
“Isso porque, uma vez arrecadado, configurando a carga tributária bruta, há a quase imediata devolução a determinados segmentos sociais na forma de subsídios, isenções, transferências sociais e pagamentos dos juros do endividamento público. Noutras palavras, R$ 2 de cada R$ 3 só passeiam pela esfera pública antes de retornar aos ricos e às empresas”, aponta.
De acordo com a Auditoria Cidadã da Dívida, do orçamento federal executado em 2018, no valor de R$ 2,621 trilhões, 40,66% foram destinados ao pagamento de juros e amortizações da dívida, que sozinhos somam mais de R$ 1 trilhão. A Previdência Social, principal política pública brasileira, acusada ultimamente de ser a grande vilã do suposto rombo nos cofres públicos, consumiu menos de 25% do orçamento. Políticas ambientais, também no alvo dos ataques do governo, tiveram repasse de 0,13% do orçamento.
“O Brasil é riquíssimo. O governo federal tem mais de R$ 1,2 trilhão no caixa único do Tesouro; tem outro trilhão no Banco Central, remunerando a sobra de caixa dos bancos de forma ilegal; tem também U$S 380 bilhões em reservas internacionais, além de todos os outros recursos que possuímos. Não há razão nenhuma para esse cenário de escassez que está dominando as finanças públicas no Brasil”, comenta Maria Lúcia Fatorelli, coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida.
Condsef/Fenadsef